04 julho 2012

Cenário

“Cenário… Dentro de tua casa, no teu quarto… Eu e tu…”

Começou assim.

È claro que antes do quarto, antes da casa, já existíamos dentro um do outro. Era um mistério para todos, mas não para nós. Sabíamos da inevitabilidade do toque antes ainda de ele existir, tínhamos a certeza de estarmos a fazer sexo um com o outro muito antes de termos os olhos em cima um do outro. Mas isto são outras histórias. Do que hoje é imperativo falar, por pena de um qualquer cataclismo ou catástrofe natural, é do sexo, do toque, do refúgio, do instinto.

Tu não conhecias o sabor da minha pele, tinhas uma vaga ideia, é certo. Já o tinhas imaginado tantas vezes quantas as que tínhamos feito sexo na tua cabeça, e na minha, mas a certeza do sabor de uma pele é coisa que só acontece depois de acontecer.

Já no meu quarto, mas ainda longe de chegar à cama, já as tuas mãos, das quais eu também só tinha uma ideia do peso sobre o meu corpo, agarravam com urgência, mas força, a minha cintura. Eu tinha o meu corpo de encontro ao teu, o espaço que nos separava era longo, apesar de quase inexistente, mas a necessidade continuada de te sentir em mim obrigava-me a puxar-te mais para perto, o mais perto possível, como se o único lugar certo fosse dentro do teu corpo, e tu dentro do meu.

Os teus braços envolveram as minhas pernas que se entrelaçaram à volta da tua cintura e sem nenhum de nós compreender exactamente como, já todo o teu corpo pesava sobre o meu, semi-nu, na cama. A roupa estava em excesso, tudo ardia e queimava, junto ao teu ouvido, sabia que a minha respiração era uma suplica quase. A violência de se querer sentir como se sente quando se quer, e quando o querer já é um vírus, um rastilho à espera de ser ateado.

Quando entraste finalmente dentro de mim tudo o resto ficou suspenso. Á nossa volta existiam todas as coisas de que se foge porque as desejamos em demasia, porque somos animais. Raiva, vingança, amor, coisas das quais se sentem saudades e às quais não sabemos dar nomes ainda, palavras que estavam por dizer, outras que é preciso que se repitam, a incredulidade de que aquilo existia e era real, explosões em sítios adormecidos, as minhas mãos a agarrem-te com violência, os teus olhos fechados com os meus lá dentro. Todas as guerras, tiroteios, gritos, urgências, condensadas no exacto momento em que o tempo já não tem tempo, já deixou de existir, já desistiu de procurar explicações para aquilo que não pode ser calculado.

Enquanto recuperámos a respiração tínhamos o rosto cheio de nós, já não sabíamos os nossos nomes, inventámo-nos outros, esquecemo-nos de quem éramos. Dentro da cabeça ficámos com turbilhões de perguntas que não tinham palavras para serem articuladas. Nada disto foi pensado ou premeditado, enquanto nos fomos embrulhando um no outro, nada disto eram pensamento ordenados ou lógicos, eram sombras difusas de desejos que queimavam aquilo que tínhamos dentro.

Já não sei se foi exactamente assim, de certo há dias em que nem sei se foi, nem levemente, assim. Olho para as imagens que quis manter paradas, como fotografias, do teu rosto pousado no meu, e já não sei bem porque ordem o sexo aconteceu. Sei que foi intenso, total, urgente e que durou a vida inteira de horas, que se prolongaram de forma supostamente infinita nos nossos corpos. Sei que estivemos lá, os dois, e que naquele momento, não existia mesmo mais nenhum lugar certo para se estar e ser.

   “Cenário… Dentro de tua casa, no teu quarto… Eu e tu…”

Começou assim.

2 comentários:

  1. Bom dia, Gil. Estou conhecendo o seu blog nesse instante, e passeei muito levemente, pois são quase 03h da manhã e preciso voltar com calma, a fim de comentar!
    Um beijo na alma, e fique na paz!

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  2. Olá Patricia! Muito obrigada por passar aqui pelo meu cantinho, esteja à vontade para voltar, ler, comentar... Dê-me o seu feedback. :) Um beijo, Beatriz Gil

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